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Mel Com Cicuta

Without the aid of prejudice and custom I should not be able to find my way across the room. William Hazlitt

Without the aid of prejudice and custom I should not be able to find my way across the room. William Hazlitt

Mel Com Cicuta

24
Jul07

Sem memória

Laura Abreu Cravo

Tenho vários amigos em processo de separação dos respectivos consortes. Casados, namorados de longa data, arranjinhos mais ou menos fixos, amizades coloridas, gente que se limita a partilhar o espaço das prateleiras da cozinha; há de tudo — E pelo menos dois terços estão (uns feliz, outros infelizmente) em processo de seguir cada um o seu caminho. Não sem grandes hesitações, não sem reconciliações temporárias e parciais, como os funerais de New Orleans (se não me falha a memória) nos quais, ao som de jazz preto e swingado, se despedem dos mortos com um cortejo onde se dão dois passos à frente e um para trás, prolongando a despedida e atribuindo um toque de languidez à angustia da perda.
E assim se tem passados estes tempos, com telefonemas nocturnos e alternados de cada um dos better half (quando acontece ser-se amigo de ambos), sempre sinceramente doídos e não falsamente convictos quanto à irreversibilidade da ruptura. Depois do exercício de oralidade típico dos amigos que dão um ombro e emprestam uma lanterna para minorar o susto de um caminho escuro adivinhado tornamos a encontrá-los, juntos e sorridentes, numa qualquer solicitação social, como se nada fosse, como se todos nos tivessemos tornado surdos, à data das conversas de antes. Até que elas (as conversas) voltam, e com elas o choro, a decepção, o desalento de ter de reaprender a caminhar sozinho.
É inevitável que fiquemos tristes e sintamos um bocadinho como nosso o fracasso emocional daqueles que nos são próximos, cujas relações afectivas se tornam instituições em vidas que não apenas as suas (afinal, adoptamos mesmo os frutos daquelas relações como se fossem filhos dos irmãos que nunca havemos de ter), mas não podemos deixar de pensar, por um bocadinho, que, no mais das vezes, a durabilidade das relações vem de todo o lado excepto do prazer imediato que elas nos proporcionam. O Homem, criatura de hábitos, prefere a ilusão de conforto de um conhecido que já não lhe aqueça a alma ao perigo iminente da solidão fria ou às amplitudes térmicas do estado de enamoramento, e por isso rumina e retarda o fim das relações já mortas, encetando (numa lógica absurda e autista de fugas para a frente) uma sucessão de novas tentativas, repristinações e recomeços. O problema é que “o recomeço” — esse conceito nobre e luminoso que encobre uma demão de tinta mal enjorcada na nossa parede grafitada de emoções — só funcionaria se pudéssemos, um dia, reencontrar o outro, sem memória.
23
Jul07

Royalties

Laura Abreu Cravo
O Queridíssimo Luís — que tem um blogue onde o bom gosto é elevado à categoria valor moral (coisa que, aliás, aplaudimos) — passa-me mais uma destas correntes que têm por objectivo entrar-nos casa dentro e espreitar as estantes dos livros. Ora, não só este blogue já se pronunciou amplamente sobre as leituras em curso (e recém terminadas), como começa a temer represálias dos agentes infiltrados da CIA que se amofinam um pouco por todo o lado quando há referências a russos ou outra coisa do género. Assim, e porque, infelizmente, não podemos fazer toda a gente feliz e apresentar nos escaparates pessoais coisas mais modernas e que ficariam certamente mais simpáticas na lapela se pretendêssemos transmitir um ar mais blasée (olhando a magnificência de alguns clássicos com esgar de enfado) e menos, (vá…), snobbish, vamos deixar cair a corrente, e, num correcto exercício de autismo e boa vizinhança falar um pouco sobre:
(i) Esta maravilhosa rubrica em jeito de crónica sócio-estética que o Luís tem lançado (não tão regularmente como se desejaria) no seu Choose a Royal, e
(ii) O faro magnífico que tem para aconselhar as festas certas, nos locais adequados, invadidos por multidões ordeiras que propiciam noites entre o irrepreensivelmente chic e o delicioso drôle decadente.
No mais, será sempre um prazer acompanhar o cavalheiro num pé de dança, a distâncias regulamentares homologadas nos melhores bailaricos de bairro.
20
Jul07

Idiossincrasias

Laura Abreu Cravo
Sempre admirei os moderados na mesmíssima medida em que os desprezei. Incoerência? Passamos a teorizar:
Se, por um lado, não aprecio o radicalismo bacoco e soberbo de certezas inexpugnáveis (que não reflecte muito mais do que uma limitação de horizontes), por outro, incomoda-me a lassidão dos que recorrem à moderação como desculpa para o comodismo (escudando-se nela como pretexto para a ausência de uma verdadeira e consciente formação de vontade).
No mais, o segredo para o sucesso do diálogo não está necessariamente na moderação na defesa de opiniões, mas antes na elevação de carácter que requer que se ponha em prática uma educação imaculada, ouvindo o próximo que nos seja ideológica e socialmente distante e na inteligência de aproveitar o que de bom tenham as ideias distintas das nossas.
De facto, admito ter estado enganada este tempo todo. Aquilo pelo que nutri sempre alguma simpatia foi pela ponderação, pela análise distanciada e pesagem tão descomprometida quanto possível de prós e contras. Uma vez formada a vontade e respeitados os requisitos básicos de uma educação que respeite padrões mínimos de civilização, parece-me que a moderação bem pode ir dar uma curva.
19
Jul07

A housewarming post

Laura Abreu Cravo



A vida dá tantas voltas que nos vai transportando para latitudes opostas em espaços curtos de tempo e propiciando alguns choques anafilácticos aos organismos mais sensíveis a viagens longas e turbulentas. O síndrome de Roller Coaster (podia muito bem chamar-se assim) dos que vão sendo, à vez, albarroados pelo impacto da novidade ou mareados pelo embalo do tédio. Na ausência de minutas para a transposição dos dias (porque nunca são iguais, e, mesmo os mais padronizados, vão carecendo de adaptação ao caso concreto) criam-se mecanismos que permitam sobreviver às hostilidades circunstanciais: para uns, a formação de hábitos e rotinas que transmitam uma segurança aparente e um conforto sólido; para outros a adopção de uma carapaça dura e camaleónica que possibilite a concretização imaculada da longa jornada.
Os mais dados a tiques solitários, umbiguistas, misantropos, as gentes mais desligadas da Gente tenderão a acrescentar aos mecanismos anteriores um que lhes permita estar igualmente imunes as efeitos que o excesso de humanidade possa ter nas vidas. Nada contra. Afinal grande parte da graça da humanidade reside no estimulante exercício teórico quer passa por evitá-la. A todo o tempo. Contudo, até para esses -- mais avessos à invasão do seu perímetro de segurança vivencial -- que consideram a solidão o terreno ideal para a contemplação serena dos dias, vale a máxima Balzaquiana de que a solidão é agradável, mas precisamos sempre de alguém a quem o dizer.
Assim, e porque a montanha russa na qual nos movimentamos diariamente tem lugar para vários ocupantes (cada um deles cioso do seu espaço mas igualmente ávido de cumplicidades) hoje celebramos uma nova etapa na vida de I. Sempre próxima, ali ao lado, à distância de um apelo, passará a estar ainda mais perto, à mão de semear. Porque já que não conseguimos escusar-nos a semear ventos, mais vale ter por aqui quem nos ajude a colher eventuais tempestades.

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