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Abr09
Vamos falar de liberdade?
Laura Abreu Cravo
Nem por um segundo passaria pela minha cabeça direitista negar ou relativizar a importância do 25 de Abril, muito pelo contrário. Mas a posição totalitária que algumas pessoas assumem em relação às virtudes da revolução — como se das suas próprias virtudes se tratasse — é algo que só se explica se olharmos para uma questão de relevância geral à sombra do impacto particular sentido por cada um.
Eu explico: as pessoas muitíssimo ofendidas com piadolas sobre a ditadura ou revolução poderão ser (i) gente que sofreu os horrores do regime ditatorial na pele (ii) gente que sofreu os horrores do regime imediatamente pós-ditatorial na pele ou (iii) gente com uma enorme incapacidade de auto-ironia. Se, até nas profundezas do meu ser tomadas pelo sarcasmo, reconheço total legitimidade aos primeiros e segundos (incapazes de distanciamento por não serem objectivamente distantes); já quanto os terceiros, começa a tomar forma o meu lado segurem-me-que-eu-vou-me-a-eles.
São os defensores que se confundem com a causa defendida, que sacralizam nos seus rituais e lapela momentos que pertencem a todos. É, exactamente porque pertence a todos, que a todos assiste o direito de fazer o uso que entender da liberdade que lhe foi trazida (na exacta medida do legalmente permitido, entenda-se). Seja marchando avenida abaixo ou, como eu, que tenho horror a manifestações e marchas, procurando barricar-me em casa nos dias das ditas. Mas não admito, por um minuto, que os puritanos das liberdades me imponham uma forma ou padrão colectivo de demonstrar o meu respeito pela liberdade. Mesmo que me apeteça fazer uma piada que outros julguem ser idiota. Porque, se bem me lembro, também se lutou pelo direito à piada idiota. Ou, pelo menos, a constituição de 74 não continha nenhuma excepção a esse caso concreto no capítulo das liberdades.
Todos comigo: Quem não tem capacidade de rir de si próprio é cócó.